21.6.11

Demolição de construção em área de proteção ambiental

Eu coloquei mais abaixo a notícia da decisão judicial para demolição de um hotel construído em Campos do Jordão em área de proteção ambiental. Um conhecido meu ia se hospedar nele e, preocupado com a sentença, ligou lá e perguntou se ainda podia ir. Disseram que era só uma sentença e que o hotel era credenciado pela Copa. A decisão era nada, em resumo.

Assim, para mostrar que coisas assim não tem tido muito sucesso com alguns julgadores, segue um julgado abaixo. O construtor de hotel em área de proteção ambiental teria que demolir e arcar com os custos disso.


REsp 769753 / SC
RECURSO ESPECIAL
2005/0112169-7
Relator(a)
Ministro HERMAN BENJAMIN (1132)
Órgão Julgador
T2 - SEGUNDA TURMA
Data do Julgamento
08/09/2009
Data da Publicação/Fonte
DJe 10/06/2011
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
RESPONSABILIDADE POR DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. ZONA COSTEIRA.
LEI 7.661/1988. CONSTRUÇÃO DE HOTEL EM ÁREA DE PROMONTÓRIO. NULIDADE
DE AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA URBANÍSTICO-AMBIENTAL. OBRA POTENCIALMENTE
CAUSADORA DE SIGNIFICATIVA DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. ESTUDO
PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL - EPIA E RELATÓRIO DE IMPACTO AMBIENTAL
- RIMA. COMPETÊNCIA PARA O LICENCIAMENTO URBANÍSTICO-AMBIENTAL.
PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR (ART. 4°, VII, PRIMEIRA PARTE, DA LEI
6.938/1981). RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 14, § 1°, DA LEI
6.938/1981). PRINCÍPIO DA MELHORIA DA QUALIDADE AMBIENTAL (ART. 2°,
CAPUT, DA LEI 6.938/1981).
1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta pela União com a
finalidade de responsabilizar o Município de Porto Belo-SC e o
particular ocupante de terreno de marinha e promontório, por
construção irregular de hotel de três pavimentos com aproximadamente
32 apartamentos.
2. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, deu
provimento às Apelações da União e do Ministério Público Federal
para julgar procedente a demanda, acolhendo os Embargos
Infringentes, tão-só para eximir o proprietário dos custos com a
demolição do estabelecimento.
3. Incontroverso que o hotel, na Praia da Encantada, foi levantado
em terreno de marinha e promontório, este último um acidente
geográfico definido como "cabo formado por rochas ou penhascos
altos" (Houaiss). Afirma a união que a edificação se encontra, após
aterro ilegal da área, "rigorosamente dentro do mar", o que, à época
da construção, inclusive interrompia a livre circulação e passagem
de pessoas ao longo da praia.
4. Nos exatos termos do acórdão da apelação (grifo no original): "O
empreendimento em questão está localizado, segundo consta do próprio
laudo pericial às fls. 381-386, em área chamada promontório. Esta
área é considerada de preservação permanente, pela legislação do
Estado de Santa Catarina por meio da Lei n° 5.793/80 e do Decreto n°
14.250/81, bem como pela legislação municipal (Lei Municipal n°
426/84)".
5. Se o Tribunal de origem baseou-se em informações de fato e na
prova técnica dos autos (fotografias e laudo pericial) para decidir
a) pela caracterização da obra ou atividade em questão como
potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente - de modo a exigir o Estudo Prévio de Impacto Ambiental
(Epia) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) - e b) pela
natureza non aedificandi da área em que se encontra o hotel
(fazendo-o também com fulcro em norma municipal, art. 9°, item 7, da
Lei 426/1984, que a classifica como "Zona de Preservação
Permanente", e em legislação estadual, Lei 5.793/1980 e Decreto
14.250/1981), interditado está ao Superior Tribunal de Justiça rever
tais conclusões, por óbice das Súmulas 7/STJ e 280/STF.
6. É inválida, ex tunc, por nulidade absoluta decorrente de vício
congênito, a autorização ou licença urbanístico-ambiental que ignore
ou descumpra as exigências estabelecidas por lei e atos normativos
federais, estaduais e municipais, não produzindo os efeitos que lhe
são ordinariamente próprios (quod nullum est, nullum producit
effectum), nem admitindo confirmação ou convalidação.
7. A Lei 7.661/1988, que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento
Costeiro, previu, entre as medidas de conservação e proteção dos
bens de que cuida, a elaboração de Estudo Prévio de Impacto
Ambiental - Epia acompanhado de seu respectivo Relatório de Impacto
Ambiental - Rima.
8. Mister não confundir prescrições técnicas e condicionantes que
integram a licença urbanístico-ambiental (= o posterius) com o
próprio Epia/Rima (= o prius), porquanto este deve, necessariamente,
anteceder aquela, sendo proibido, diante da imprescindibilidade de
motivação jurídico-científica de sua dispensa, afastá-lo de forma
implícita, tácita ou simplista, vedação que se justifica tanto para
assegurar a plena informação dos interessados, inclusive da
comunidade, como para facilitar o controle administrativo e judicial
da decisão em si mesma.
9. Indubitável que seria, no plano administrativo, um despropósito
prescrever  que a União licencie todo e qualquer empreendimento ou
atividade na Zona Costeira nacional. Incontestável também que ao
órgão ambiental estadual e municipal falta competência para, de
maneira solitária e egoísta, exercer uma prerrogativa - universal e
absoluta - de licenciamento ambiental no litoral, negando
relevância, na fixação do seu poder de polícia licenciador, à
dominialidade e peculiaridades do sítio (como áreas representativas
e ameaçadas dos ecossistemas da Zona Costeira, existência de
espécies migratórias em risco de extinção, terrenos de marinha,
manguezais), da obra e da extensão dos impactos em questão,
transformando em um nada fático-jurídico eventual interesse concreto
manifestado pelo Ibama e outros órgãos federais envolvidos
(Secretaria do Patrimônio da União, p. ex.).
10. O Decreto Federal 5.300/2004, que regulamenta a Lei 7.661/1988,
adota como "princípios fundamentais da gestão da Zona Costeira" a
"cooperação entre as esferas de governo" (por meio de convênios e
consórcios entre União, Estados e Municípios, cada vez mais comuns e
indispensáveis no campo do licenciamento ambiental), bem como a
"precaução" (art. 5°, incisos XI e X, respectivamente). Essa postura
precautória, todavia, acaba esvaziada, sem dúvida, quando, na
apreciação judicial posterior, nada mais que o fato consumado da
degradação ambiental é tudo o que sobra para examinar, justamente
por carência de diálogo e colaboração entre os órgãos ambientais e
pela visão monopolista-exclusivista, territorialista mesmo, da
competência de licenciamento.
11. Pacífica a jurisprudência do STJ de que, nos termos do art. 14,
§ 1°, da Lei 6.938/1981, o degradador, em decorrência do princípio
do poluidor-pagador, previsto no art. 4°, VII (primeira parte), do
mesmo estatuto, é obrigado, independentemente da existência de
culpa, a reparar - por óbvio que às suas expensas - todos os danos
que cause ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade,
sendo prescindível perquirir acerca do elemento subjetivo, o que,
consequentemente, torna irrelevante eventual boa ou má-fé para fins
de acertamento da natureza, conteúdo e extensão dos deveres de
restauração do status quo ante ecológico e de indenização.
12. Ante o princípio da melhoria da qualidade ambiental, adotado no
Direito brasileiro (art. 2°, caput, da Lei 6.938/81), inconcebível a
proposição de que, se um imóvel, rural ou urbano, encontra-se em
região já ecologicamente deteriorada ou comprometida por ação ou
omissão de terceiros, dispensável ficaria sua preservação e
conservação futuras (e, com maior ênfase, eventual restauração ou
recuperação). Tal tese equivaleria, indiretamente, a criar um
absurdo cânone de isonomia aplicável a pretenso direito de poluir e
degradar: se outros, impunemente, contaminaram, destruíram, ou
desmataram o meio ambiente protegido, que a prerrogativa valha para
todos e a todos beneficie.
13. Não se pode deixar de registrar, em obiter dictum, que causa no
mínimo perplexidade o fato de que, segundo consta do aresto
recorrido, o Secretário de Planejamento Municipal e Urbanismo,
Carlos Alberto Brito Loureiro, a quem coube assinar o Alvará de
construção, é o próprio engenheiro responsável pela obra do hotel.
14. Recurso Especial de Mauro Antônio Molossi não provido. Recursos
Especiais da União e do Ministério Público Federal providos.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior
Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, negou provimento ao
recurso do particular e deu provimento aos recursos da União e
Ministério Público Federal, nos termos do voto do(a) Sr(a).
Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques,
Eliana Calmon, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr.
Ministro Relator.

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