Este é um blog destinado a divulgar, de maneira informal, notícias da 1a. Vara da Fazenda Pública de Osasco, herdeira do Anexo Fiscal 1 da Comarca. Também serve para receber sugestões de melhoria dos trabalhos.
27.4.12
Lotação no metrô
Sei que isso não parece muito "jurídico", mas é um assunto para lá de importante
Lotação da Estação Paulista já supera, proporcionalmente, a da Sé
Projetada para 145 mil usuários/dia, parada da Linha 4 recebe 300 mil e está saturada em 100%. Sé comporta 1 milhão, mas recebe 800 mil
26 de abril de 2012 | 22h 30
Bruno Ribeiro e Nataly Costa - O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - A Estação Paulista do Metrô completou nesta quinta-feira, 26, sete meses de operação integral da primeira fase da Linha 4-Amarela, entre o Butantã e a Luz, com um feito. A parada conseguiu superar, proporcionalmente, o congestionamento da estação-símbolo da superlotação: a Sé, conexão entre as Linhas 1-Azul e 3-Vermelha. A Paulista recebe diariamente 300 mil passageiros, o dobro da capacidade para o qual foi projetada: 145 mil. Pela Sé passam 800 mil usuários, onde seriam suportados 1 milhão - há momentos de folga.
Veja também:
VÍDEO: Estação Paulista do metrô atende o dobro da capacidade
'Metrô: tira minha vida, mas deixa a minha casa'
Monotrilho SP-ABC e corredores de ônibus terão dinheiro do PAC
VÍDEO: Estação Paulista do metrô atende o dobro da capacidade
'Metrô: tira minha vida, mas deixa a minha casa'
Monotrilho SP-ABC e corredores de ônibus terão dinheiro do PAC
Hélvio Romero/AE
240 mil passam pelo corredor que liga as estações Paulista e Consolação
A sensação de superlotação na Paulista ocorre principalmente por causa do maior gargalo da Linha 4: o túnel que liga a parada à Estação Consolação, na Linha 2-Verde (Vila Prudente-Vila Madalena). Dados da ViaQuatro, concessionária que administra a Linha 4, mostram que 80% das pessoas que usam a Estação Paulista passam pelo corredor - ou seja, 240 mil por dia.
A ViaQuatro já estuda construir uma nova saída da estação, pela Rua Bela Cintra, para desafogar o túnel.
No "tubo" ou "corredor da morte", como já foi apelidado, há a tecnologia de esteiras rolantes para agilizar o percurso e piso tátil para deficientes. A lotação, porém, é tanta que parte desses recursos se mostrou inútil: as esteiras rolantes são desligadas no horário de pico "por segurança" e por não suportar o fluxo de usuários espremidos na passagem.
As escadas rolantes ficam direcionadas para um só sentido do túnel. O piso tátil também é inutilizado: para tentar organizar o caos no corredor, os funcionários da ViaQuatro instalam fitas divisórias bem em cima do piso para os deficientes.
"Com a operação de uma nova linha, como a 4-Amarela, conhecida como ‘de integração’, porque cruza três linhas da CPTM e três do Metrô, é natural que haja um novo acomodamento da rede e algumas estações fiquem mais carregadas e outras menos", informou o Metrô, por meio de nota.
Para o engenheiro civil Creso de Franco Peixoto, professor da FEI, há um descompasso entre a oferta e a demanda. "Coloca-se a linha para funcionar e meses depois já está saturada. Por quê? Porque a capacidade de construção do metrô em São Paulo é muito menor do que a demanda", disse. "O tamanho do túnel é adequado. O problema é a necessidade de mais linhas."
Medidas paliativas. Enquanto isso, para tentar amenizar o caos, a empresa tem adotado soluções imediatas. Um exemplo é a nova sinalização no piso que pede aos usuários para esperar o desembarque do trem ao lado das portas.
"Quinze segundos é o tempo necessário para cada uma das operações de embarque e desembarque. Quando os passageiros tentam embarcar no mesmo momento do desembarque, essa operação leva cerca de 45 segundos", disse a empresa, em nota.
25.4.12
Do blog do Lauro Jardim
17:33 \ Judiciário
O bacalhau
Magistrados do Rio de Janeiro estão preocupados com o bacalhau. Dizem que, se não aceitam um pedido da Polícia ou do MP para escutas telefônicas, são taxados de coniventes com o crime. E, se aceitam, reclamam que sempre tem um bacalhau no meio.
A expressão é usada para as escutas adicionais enfiadas no pedido judicial, mas que não têm nada a ver com a investigação e servem para alimentar arapongagens e obter informações privadas de forma irregular com uma certa cobertura de legalidade.
Um ótimo artigo
Do Judex. Ecoando a pergunta da Carolina, a quem interessa um Judiciário fraco?
A verdade é que as pessoas fazem coisas erradas e por vezes isso vai para o Judiciário. Este julga e aplica a lei. Aliás, fico abismado com o que vejo de pessoas dirigindo violando as normas de trânsito. Agora, na cidade de São Paulo, com lixeiras espalhadas pela cidade, fico chocado com a quantidade de lixo nas ruas. Gente, essa é a população que gera problemas que serão julgados pelo Judiciário. Podemos trabalhar 36 horas por dia, mas com esse grau de desrespeito, não vai dar. Não mesmo!!!
A verdade é que as pessoas fazem coisas erradas e por vezes isso vai para o Judiciário. Este julga e aplica a lei. Aliás, fico abismado com o que vejo de pessoas dirigindo violando as normas de trânsito. Agora, na cidade de São Paulo, com lixeiras espalhadas pela cidade, fico chocado com a quantidade de lixo nas ruas. Gente, essa é a população que gera problemas que serão julgados pelo Judiciário. Podemos trabalhar 36 horas por dia, mas com esse grau de desrespeito, não vai dar. Não mesmo!!!
23 de abril de 2012
Sobre o maniqueísmo da Justiça e injustiça dos que devem
Quem não deve não teme, certo?
Dizem que a Justiça tarda mas não falha e que pimenta nos olhos dos outros é refresco, mas muitas vezes, enquanto a Verdade e a Justiça tardam, esperando os fatos se esclarecerem, os olhos de quem não deve seguem ardendo com a pimenta que aqueles que devem e temem jogaram, como cortina de fumaça...
Sim, por que existe melhor defesa do que o ataque?
Qualquer pessoa que atue na Justiça Criminal pode atestar tal fato. É comum o agressor inverter os fatos, jurando que foi ele o agredido, o estuprador culpar a vítima, o difamador atestar que o que diz é a mais pura verdade, e até que a verdade se reestabeleça, a vítima é agredida, violada e vitimizada pela segunda vez. Quando os fatos ganham publicidade na imprensa, a cada vez que esta inversão da verdade se propaga, nova agressão ocorre, o delito se prolonga no tempo e esse tardar ganha os contornos de tortura.
Quanto mais a vítima se debate tentando colocar as coisas no lugar e mostrar que é inocente, mais parece culpada...
Não seria diferente quando o agredido é o Poder Judiciário.
Não é comum o Judiciário ver-se alvo do tipo de acusações que se está verificando nos últimos meses.
A crítica a este Poder sempre foi a morosidade, o distanciamento dos juízes, sua aparente inacessibilidade.
Tangenciavam-se questionamentos mais severos chamando as prerrogativas que garantiam a independência e a imparcialidade dos juízes de privilégios, mas não se chamavam os juízes de bandidos.
Não se insinuava que julgamentos eram comprados ou motivados por interesse pessoal.
Nunca antes na história deste país, de que me recorde, foi a Magistratura acusada como um todo de criminosa, conivente com práticas ilegais ou corrupta sem qualquer fato a corroborar tal acusação.
O que dizer diante da violência de frases jogadas sem dados concretos e sem nomes? Quando qualquer tentativa de defesa era usada para continuar os ataques e o silêncio podia soar incriminador?
Meses depois da acusação, ainda se aguardam os nomes de tais bandidos e os fatos que motivaram estas declarações.
Outro dia fui relatar ao Seccional da Polícia Civil da cidade onde trabalho, delegado sério e honesto, segundo me informaram, denúncia que recebi de uso de entorpecentes próximo a áreas públicas frequentadas por crianças, fato que não me dizia respeito enquanto juíza da área cível, mas sim como cidadã, e este se disse muito chateado com a desmoralização do Judiciário. Disse que se perguntava quem ganharia com isso, porque ele já sentia que o trabalho da Polícia estava mais difícil com o respeito que estava se perdendo pela Instituição e com a falta de crença na Justiça. Disse que em mais de vinte anos como delegado, sempre foi testemunha da lisura e da retidão dos juízes com quem trabalhou.
Também fiz essa pergunta a todos os jornalistas que frequentaram os cursos sobre o Judiciário e Imprensa na Escola Paulista da Magistratura, que coordenei: A quem interessa um Poder Judiciário fraco?
A quem é honesto e cumpre as leis?
Agora vemos um dos maiores acusadores do Judiciário e um dos críticos ferrenhos daMagistratura acusado de envolvimento com o crime organizado.
Pode ser que injustamente, não se sabe ainda, e que esteja tomando um pouco do próprio remédio, mas isso leva a pensar na motivação dos defensores ferrenhos das modificações legislativas com o intuito de mitigar os poderes do juiz na condução do processo e de retirar suas garantias enquanto julgador, não?
Aprendi no curso de Jornalismo a primeiro avaliar a fonte para só então dar algum crédito à informação (e admito que aplico isso a todas as áreas da minha vida até hoje) e no curso de Direito que todos são inocentes até que se prove o contrário (e não o inverso) e que têm o direito à mais ampla defesa.
Quando alguém me fala algo, busco os fatos, analiso os interesses ocultos, e se não há fundamento, sinceramente, não tenho tempo a perder com malediscências e fofocas,quando há tanto trabalho a fazer, quando há tanto a ser melhorado no mundo que pretendo deixar para os meus filhos.
Se há fundamento, ouço os outros envolvidos. Afinal, toda história tem não dois, mas vários lados e todos precisam ser analisados para se formar um todo que tenha lógica e faça sentido.
Voltando ao juiz na berlinda, bom, o juiz sempre vai apontar o que é errado e colocar o dedo na ferida, doa a quem doer e isso incomoda a quem deve ser incomodado, porque ele é pago para isso. Ele é escolhido em concurso extremamente difícildepois de mostrar que é capaz de trabalhar com esse tipo de pressão. É isso o que se espera de um Judiciário forte. Que não se intimide para que o homem de bem não precise se intimidar.
Porque é por ele que o Judiciário precisa ser forte. É ele que não precisa temer porque sabe que os juízes não vão se acovardar nas decisões que forem dar nos autos dos processos.
Porque a Justiça nunca vai poder deixar de ser maniqueísta. Há o certo e há o errado e o errado não vai passar a ser certo desmoralizando a Justiça. Uma Justiça fraca pode até fechar os olhos ao errado, mas isso não o tornará certo.
Porque o que é certo é certo e isso nunca vai mudar.
Carolina Nabarro Munhoz Rossi
Juíza de Direito
24.4.12
23.4.12
Dano moral contra juiz de Direito
Essa vem do site do TJ/SP
PROMOTOR DEVE INDENIZAR MAGISTRADO POR SUPOSTA OFENSA À HONRA
Decisão da 2ª Câmara de Direito Privado da Corte paulista manteve sentença que
condenou promotor de Justiça a indenizar magistrado por dano moral.
O pedido se refere a uma apelação interposta por Arthur Migliari Júnior contra
a sentença que julgou procedente ação para condená-lo a pagar a quantia de R$ 20 mil a
Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, pelo suposto uso de expressões ofensivas à sua honra.
Para o apelante – que alegou, entre outras coisas, cerceamento de defesa – o valor da
indenização fixada foi excessivo, motivo pelo qual pleiteou a reforma da sentença.
Segundo o desembargador Flávio Abramovici, relator da apelação, “cerceamento de
defesa não houve, porque a condenação do requerido decorre do excesso de linguagem
contido no documento por ele redigido. Esse documento é, portanto, prova suficiente
para a caracterização do dano”. Com base nessas considerações, negou provimento
ao recurso, mantendo a sentença.
Os desembargadores José Carlos Ferreira Alves e José Joaquim dos Santos acompanharam o voto do relator.
Apelação nº 0109863-33.2010.8.26.2010
Comunicação Social TJSP – AM (texto) / AC (foto ilustrativa)
22.4.12
Doação de sangue por gays
Outra questão beeeeem interessante. Matéria do Conjur
abril2012 No entanto, em junho de 2011, o Ministério da Saúde baixou uma portaria que proíbe os hemocentros de usar a orientação sexual (heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade) como critério para seleção de doadores de sangue. “Não deverá haver, no processo de triagem e coleta de sangue, manifestação de preconceito e discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, hábitos de vida, atividade profissional, condição socioeconômica, raça, cor e etnia”. Mas, na prática, os homossexuais masculinos ativos sexualmente seguem impedidos de doar sangue. Para as lésbicas, não há restrições. O coordenador de Sangue e Hemoderivados do ministério, Guilherme Genovez, alega que a norma brasileira é avançada quando comparada à legislação de outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, um homem que tenha tido, no mínimo, uma relação sexual com outro homem fica proibido de doar sangue pelo resto da vida. “Acima de tudo, está o direito de um paciente receber sangue seguro”, alega o coordenador, lembrando que os testes não identificam imediatamente a presença de vírus em uma bolsa de sangue. Desde o ano passado, o governo federal está implantando o NAT, sigla em inglês para teste de ácido nucleico, para tornar mais segura a análise do sangue colhido pelos hemocentros. O exame reduz a chamada janela imunológica, que é o período de tempo entre a contaminação e a detecção da doença por testes laboratoriais. Com o NAT, o intervalo de detecção do vírus HIV cai de 21 para dez dias. Até agora, 59% do sangue doado no país passam pelo NAT. A previsão é que a tecnologia chegue a todos os hemocentros até julho. Motivado por uma campanha da empresa onde trabalha, em Belo Horizonte, o produtor cultural Danilo França, de 24 anos, decidiu doar sangue pela primeira vez. Junto com um grupo de colegas, seguiu as etapas previstas: preencheu a ficha de inscrição e foi para a entrevista com o médico do hemocentro. No momento da conversa, França descobriu que não poderia doar sangue porque mantém um relacionamento homossexual. “Fiquei atordoado, sem graça. Fiquei chateado e me senti discriminado”, disse França. Entidades de defesa dos direitos dos homossexuais reclamam da restrição e querem reacender o debate sobre o tema. “A cada fato novo, a gente tem que abrir a discussão. Se a pessoa usa preservativo e não tem comportamento de risco, não pode ser impedida de doar”, argumenta Toni Reis, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT).
abril2012
CRITÉRIO CONTRADITÓRIO
Homens gays não podem doar sangue
Uma norma nacional considera inapto à doação qualquer homem que tenha se relacionado sexualmente com outro homem no período de 12 meses. O mesmo vale para heterossexuais que, no mesmo período, se relacionaram sexualmente com várias parceiras.
A regra do Ministério da Saúde, que vigora há mais de sete anos e vale para todos os hemocentros, foi baseada em estudos internacionais que apontam que o risco de contágio pelo vírus da aids (HIV) é 18 vezes maior nas relações entre homossexuais masculinos, na comparação com relações entre pessoas heterossexuais. O motivo é a prática do sexo anal, que aumenta o risco de contaminação por doenças sexualmente transmissíveis (DST). Foi essa determinação que fez com que a Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia de Minas Gerais (Hemominas) negasse ao produtor cultural a possibilidade de doar sangue. Com informações da Agência Brasil.
Revista Consultor Jurídico, 21 de abril de 2012
Mais um do Para Entender Direito
O assunto é bem interessante.
Saiu na Folha de hoje (20/4/12):
“Operação-padrão da PF em 30 aeroportos ocorre sem filas
A Polícia Federal realizou ontem operação-padrão em 30 aeroportos. Participaram 480 agentes, segundo a Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federais), que coordenou o protesto.
O objetivo, disse o presidente da instituição, Marcos Wink, foi criticar a contratação de funcionários terceirizados para desempenhar funções da PF, como o controle de passageiros nas áreas de embarque e desembarque.
Os agentes checaram documentos e bagagens dos passageiros e também distribuíram folhetos explicativos (...)
De acordo com a Infraero, estatal que gerencia os aeroportos brasileiros, não foram registrados tumultos e o índice de atraso nos voos foi de 7,3%, abaixo da média diária, que é de 8% (...)
A categoria calcula que, hoje, 1.300 terceirizados recebam passageiros em guichês da PF no país, sob supervisão de policiais. Em contratos com empresas para este serviço, o governo federal gasta cerca de R$ 9 milhões”
Você está dirigindo seu carro em uma avenida movimentada e quer virar. Você olha para ver se há algum pedestre ou veículo fazendo algo estranho, olha pelo retrovisor para ver se pode mudar de pista, dá seta, move o volante, muda de faixa, endireita o volante, olha pelo retrovisor novamente, pisa no freio, aperta a embreagem, reduz a marcha, dá seta, volta com a mão para o volante, inicia o movimento do volante, olha pelo retrovisor, observa a lateral e o que estiver na frente, redireciona o volante, aperta a embreagem, aumenta a marcha, aperta o acelerador etc. Enfim, você conseguiu entrar na rua que queria.
Sem pensar, você faz isso milhares de vezes todos os dias. Eles se tornam hábitos porque fazem sentido. Você sabe que se não fizer, o risco de bater o carro ou morrer em um acidente aumenta exponencialmente. Essa é sua ‘operação padrão na direção’ e a maioria das pessoas – ao menos das pessoas racionais – respeita essa ‘operação padrão’ diariamente. Isso porque essas regras de conduta geram eficiência, reduzindo desperdício (mortes, acidentes) e esforço comparado com outras opções (imagine como é ineficiente organizar uma corrida de Fórmula 1 só para que 24 pilotos possam correr por 2 horas sem precisar dar seta ou se preocupar com pedestres atravessando o circuito).
Mas você já parou para pensar como é ilógico que quando os agentes estatais querem protestar eles fazem isso apenas cumprindo a norma através de suas operações padrões?
Há dois pontos nisso:
Primeiro, que se esses agentes do Estado resolvem cumprir o que a norma diz apenas quando querem protestar, exatamente o que estão fazendo quando não estão em uma situação de protesto? As normas servem para serem respeitadas. Se não fossem para serem respeitadas e determinarem obrigações, não seriam normas, seriam sugestões de conduta ou regras morais. Se a norma quer dar a possibilidade do agente do Estado ter alguma discrição, ela estabelece os parâmetros dentro dos quais a discrição pode ser exercida. Nas democracias, a norma nunca dá o poder a um agente estatal de fazer o que bem quiser.
O que chamamos de ‘operação padrão’ não é mais do que o cumprimento da norma como ela deve ser cumprida. O problema não está no que acontece durante a operação padrão, mas o que acontece fora dela. Afinal, nos outros dias (os ‘não-padronizados’) qual é a norma que está sendo cumprida se não é a norma aprovada? E quem deu ao agente estatal o poder de estabelecer quais normas quer cumprir? Quando os agentes estatais passam a escolher quais normas cumprirem, ou quando cumpri-las ou contra quem cumpri-las (ou quais normas não cumprir ou quem beneficiar), caímos em uma ditadura.
Mas, segundo e ainda mais importante, é que a gente fica surpreso quando uma ‘operação padrão’ não causa fila ou outro transtorno. Pense nisso: a norma foi feita para gerir nossas vidas. A sociedade, onde vivemos nossas vidas, deve ser o mais eficiente possível (caso contrário, não há por que vivermos em sociedade). Se a norma atrapalha essa eficiência, ela é uma norma ruim e não deveria ter sido feita e não deve ser mantida.
Se a Polícia Federal, ao cumprir a norma existente, gera filas enormes, é porque a norma causa ineficiência. Logo, essa norma não deveria existir. A continuação da existência de uma norma ineficiente gera dois efeitos perversos para a democracia: empurrar as pessoas para a ilegalidade (ou elas cumprem a norma e se tornam ineficientes, ou elas se tornam ilegais para passarem a ser eficientes), e possibilitam que os agentes do Estados exerçam o poder de forma despótica, já que podem punir (ou privilegiar a seu bel prazer) um enorme número de pessoas que foram forçadas à ilegalidade justamente porque o próprio Estado criou uma norma que os colocou entre a cruz (viver na ilegalidade) e a espada (viver ineficientemente).
“Operação-padrão da PF em 30 aeroportos ocorre sem filas
A Polícia Federal realizou ontem operação-padrão em 30 aeroportos. Participaram 480 agentes, segundo a Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federais), que coordenou o protesto.
O objetivo, disse o presidente da instituição, Marcos Wink, foi criticar a contratação de funcionários terceirizados para desempenhar funções da PF, como o controle de passageiros nas áreas de embarque e desembarque.
Os agentes checaram documentos e bagagens dos passageiros e também distribuíram folhetos explicativos (...)
De acordo com a Infraero, estatal que gerencia os aeroportos brasileiros, não foram registrados tumultos e o índice de atraso nos voos foi de 7,3%, abaixo da média diária, que é de 8% (...)
A categoria calcula que, hoje, 1.300 terceirizados recebam passageiros em guichês da PF no país, sob supervisão de policiais. Em contratos com empresas para este serviço, o governo federal gasta cerca de R$ 9 milhões”
Você está dirigindo seu carro em uma avenida movimentada e quer virar. Você olha para ver se há algum pedestre ou veículo fazendo algo estranho, olha pelo retrovisor para ver se pode mudar de pista, dá seta, move o volante, muda de faixa, endireita o volante, olha pelo retrovisor novamente, pisa no freio, aperta a embreagem, reduz a marcha, dá seta, volta com a mão para o volante, inicia o movimento do volante, olha pelo retrovisor, observa a lateral e o que estiver na frente, redireciona o volante, aperta a embreagem, aumenta a marcha, aperta o acelerador etc. Enfim, você conseguiu entrar na rua que queria.
Sem pensar, você faz isso milhares de vezes todos os dias. Eles se tornam hábitos porque fazem sentido. Você sabe que se não fizer, o risco de bater o carro ou morrer em um acidente aumenta exponencialmente. Essa é sua ‘operação padrão na direção’ e a maioria das pessoas – ao menos das pessoas racionais – respeita essa ‘operação padrão’ diariamente. Isso porque essas regras de conduta geram eficiência, reduzindo desperdício (mortes, acidentes) e esforço comparado com outras opções (imagine como é ineficiente organizar uma corrida de Fórmula 1 só para que 24 pilotos possam correr por 2 horas sem precisar dar seta ou se preocupar com pedestres atravessando o circuito).
Mas você já parou para pensar como é ilógico que quando os agentes estatais querem protestar eles fazem isso apenas cumprindo a norma através de suas operações padrões?
Há dois pontos nisso:
Primeiro, que se esses agentes do Estado resolvem cumprir o que a norma diz apenas quando querem protestar, exatamente o que estão fazendo quando não estão em uma situação de protesto? As normas servem para serem respeitadas. Se não fossem para serem respeitadas e determinarem obrigações, não seriam normas, seriam sugestões de conduta ou regras morais. Se a norma quer dar a possibilidade do agente do Estado ter alguma discrição, ela estabelece os parâmetros dentro dos quais a discrição pode ser exercida. Nas democracias, a norma nunca dá o poder a um agente estatal de fazer o que bem quiser.
O que chamamos de ‘operação padrão’ não é mais do que o cumprimento da norma como ela deve ser cumprida. O problema não está no que acontece durante a operação padrão, mas o que acontece fora dela. Afinal, nos outros dias (os ‘não-padronizados’) qual é a norma que está sendo cumprida se não é a norma aprovada? E quem deu ao agente estatal o poder de estabelecer quais normas quer cumprir? Quando os agentes estatais passam a escolher quais normas cumprirem, ou quando cumpri-las ou contra quem cumpri-las (ou quais normas não cumprir ou quem beneficiar), caímos em uma ditadura.
Mas, segundo e ainda mais importante, é que a gente fica surpreso quando uma ‘operação padrão’ não causa fila ou outro transtorno. Pense nisso: a norma foi feita para gerir nossas vidas. A sociedade, onde vivemos nossas vidas, deve ser o mais eficiente possível (caso contrário, não há por que vivermos em sociedade). Se a norma atrapalha essa eficiência, ela é uma norma ruim e não deveria ter sido feita e não deve ser mantida.
Se a Polícia Federal, ao cumprir a norma existente, gera filas enormes, é porque a norma causa ineficiência. Logo, essa norma não deveria existir. A continuação da existência de uma norma ineficiente gera dois efeitos perversos para a democracia: empurrar as pessoas para a ilegalidade (ou elas cumprem a norma e se tornam ineficientes, ou elas se tornam ilegais para passarem a ser eficientes), e possibilitam que os agentes do Estados exerçam o poder de forma despótica, já que podem punir (ou privilegiar a seu bel prazer) um enorme número de pessoas que foram forçadas à ilegalidade justamente porque o próprio Estado criou uma norma que os colocou entre a cruz (viver na ilegalidade) e a espada (viver ineficientemente).
19.4.12
Ética Pública
Do Conjur
SINTOMAS DA ANEMIA
Ética pública está impaciente com os três Poderes
A ética pública está impaciente. Impaciência poderosa. Aqui e no exterior. Em relação ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário. Deverá ser fator importante nas nossas eleições. As vezes, a força política da ética tem se imposto à força normativa da lei.
O presidente da Alemanha não esperou a conclusão do processo sobre tráfico de influência. Renunciou. O rei Juan Carlos não esperou conclusões sobre o mal uso de recursos públicos por seu genro. Afastou-o da família real. A presidenta Dilma não esperou apurar denúncias contra ministros. Conduziu-os à demissão.
A ética pública está com pressa. Pressionou o Congresso para aprovar a Lei de Ficha Limpa. E ao Supremo também. Apoia a ministra Eliana Calmon em sua cruzada por uma administração judicial mais ética e transparente. Está impaciente com os resultados do foro privilegiado para políticos. Apoia exigência de contas aprovadas para candidatos. A Comissão de Ética Pública funciona.
A impaciência não é contra o presidente alemão, o genro espanhol, políticos e magistrados brasileiros. É maior. É com a necessidade das instituições do Estado democrático de Direito em controlar e punir.
Não se constrói instituições legítimas e eficientes em ambiente de anemia ética, de perda de legitimidade institucional.
Sintomas da anemia variam na história. O regime militar perdeu legitimidade porque não restaurou a liberdade e as eleições diretas. Aumentou a desigualdade social. O sintoma hoje é outro.
A plena liberdade de informação e a expansão da mídia tecnológica evidenciam que algumas instituições públicas estariam sendo apropriadas por corporativismos. O sintoma é a sua apropriação, aparelhamento, por alguns partidos, profissões, sindicatos, empresas, grupos ou indivíduos. Usam como seu algo que é da nação.
Seria a adesão de autoridades a princípios éticos sincera? Ou mera estratégia de prevenção de dano, cálculo custo-benefício? Diante da probabilidade de confirmação das denúncias agem logo. Os danos à legitimidade de sua autoridade serão menores agora do que mais tarde.
A democracia é um regime que exige recíprocas legitimações. Devemos ao outro o mesmo respeito que temos por nós mesmos. Se podemos ter princípios éticos, e defendê-los, por que as autoridades públicas não podem ter? Podem sim.
Combater a anemia do poder público implica restaurar o vigor de sua legitimidade. Este é, por exemplo, um desafio do Judiciário, maior do que a disputa entre associações de magistrados e o Conselho Nacional de Justiça. Ou de ministros do Supremo entre si. Trata-se de provar à opinião pública que algumas autoridades judiciais não usam a administração da justiça, que é bem público, como bem privado. Como provar?
Aplicar a força normativa da lei individualmente é necessário, mas insuficiente. A opinião pública está indignada é a com a cultura de pagamentos benevolentes, mesmo que aparentemente legais e de boa fé, das administrações passadas, por exemplo, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Mais do que com magistrados determinados.
O desafio é maior do que controlar individualmente. É mudar a cultura da sangria ética. Rever leis, interpretações, práticas administrativas, processos decisórios. Reinventar a administração judiciária. Reconquistar a ética perdida não se sabe bem onde, como e quando.
Joaquim Falcão é mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA), doutor em educação pela Universidade de Genebra (Suíça), professor de Direito Constitucional e diretor da Escola de Direito da FGV-RJ, e ex-conselheiro do Conselho Nacional de Justiça.
Acórdão interessante
Mudou a configuração do Blogger e ainda não sei como colocar na aba própria. Esse link que coloco aqui é interessante. O Acórdão manteve uma decisão minha.
https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/ getArquivo.do?cdAcordao= 5779562&vlCaptcha=yBwWy
https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/
18.4.12
Entrevista do Presidente do STF
Essa entrevista do Presidente Peluso ao Conjur está histórica. É muito longa e, assim, copiarei aqui somente uns trechos.
ConJur — Há pouco o STF julgou um processo de 1953.Cezar Peluso — Sim, fui o relator. Esse processo sofreu uma série de vicissitudes fortuitas. Aconteceu praticamente tudo o que se pode imaginar. Primeiro por envolver uma transação absolutamente gigante, pois o estado de Mato Grosso doou um mundaréu de terras divididas entre várias empresas colonizadoras. Era uma extensão duas vezes maior que o estado do Sergipe. A área de terra é de 42 mil quilômetros quadrados. Distribuiu para duas dezenas de colonizadoras com a obrigação de que ocupassem o território e o desenvolvessem. As colonizadoras fracionaram esses terrenos imensos, venderam lotes, foram criadas cidades, estradas, hospitais, abrindo lavouras, enfim, estimulando o desenvolvimento da região dentro do programa Marcha para o Oeste do governo Getúlio Vargas. Essa era uma parte do programa, mas o estado do Mato Grosso se esqueceu de que a Constituição de 1946 exigia que, para realizar essas doações ou concessões de domínio, o estado deveria pedir autorização para o Senado. Eles não pediram essa autorização e em 1953, quando se iniciou a demanda, já fazia anos que aquilo estava em andamento e execução. A União resolveu entrar com uma ação para anular essas concessões e se criou um problema de grandes dimensões, pois naquela altura não eram mais apenas aquelas duas dezenas de colonizadoras. Elas haviam vendido as terras para milhares de pessoas.
ConJur — Sobretudo a colonos vindos dos estados do Sul do país.Cezar Peluso — Sim, era agora uma questão de propriedades particulares, as empresas vendiam os lotes em cotas, trouxeram gente do sul, o agricultor comprava o lote, às vezes não se adaptava ou não dispunha de conhecimentos técnicos para realizar exploração e acabava vendendo para terceiros. E aí temos uma sucessão de proprietários e todas essas pessoas tinham de ser citadas no processo, afinal era a propriedade deles que estava em jogo. Imagine citar esse mundo de gente envolvida, e isso foi passando pela mão de vários ministros. Quando estava mais ou menos pronto para esse processo ser julgado anos atrás, se percebeu que faltava citar outros proprietários originais, que não se sabia onde estavam. Aí retomaram as diligências para corrigir a falha. Houve uma época em que a União percebeu que esse era um processo irreversível, na verdade tratava-se da dinâmica de urbanização, colonização e ocupação do território brasileiro, uma situação irreversível. Não seria possível voltar atrás na construção de vilas, cidades. A União desistiu do processo, isso não foi homologado e, portanto, o processo continuou. Quando assumi, tomei as últimas providências para que esta Ação Civil Originária 79 fosse julgada, pois era o processo mais antigo em andamento no Supremo. Fizemos o julgamento na semana passada. Quero ir embora, mas quero resolver essas histórias.
ConJur — Como é ver o sistema do Judiciário e da Justiça desde o centro do país? O que mudou em sua percepção? Cezar Peluso — Sou muito ligado à Justiça estadual, que é a Justiça mais próxima do povo, do cidadão, sem dúvida. Preocupo-me com ela e suas reivindicações. Mas também sou um crítico da Justiça estadual, conheço sua realidade, sei os pontos que deveriam ser mudados. Mas daqui de Brasília, a percepção muda ao ver que as coisas são mais graves do que se percebia quando estava em São Paulo. Há um problema na Justiça de São Paulo, gravíssimo, que é a falta de recursos. Agora, tirando isso, a Justiça de São Paulo é modelar. Mas no âmbito nacional, há problemas graves, sobretudo nas regiões mais longínquas. Uma das coisas que me convenceram a aderir à proposta do Conselho Nacional da Justiça no período de sua implantação foi haver convivido mais de perto com esses sérios problemas da Justiça no Brasil como um todo.
ConJur — Qual foi o momento de mais felicidade como ministro do STF?Cezar Peluso — Fora o momento da posse, nada de excepcional. Acho que nós julgamos assuntos muito importantes, alguns julgados rapidamente atendendo as demandas da sociedade, o Supremo respondeu bem a essa demandas, sobre a união homoafetiva, a diversidade de opinião, a lei de imprensa, tivemos 15 ou 20 decisões de grande repercussão social. O que me deixou de consciência tranquila é que, de certo modo, o tribunal se apaziguou um pouco durante minha gestão. Sabemos dos diálogos exacerbados entre os ministros, que aconteceram no passado. Durante minha gestão isso não aconteceu em nenhum momento. Tentei conduzir as reuniões do Plenário de uma maneira tranquila, de alto nível. Não houve nenhum episódio que relembrasse os atritos anteriores. Acho que minha moderação na direção do Supremo ajudou a refrear um pouco o entusiasmo ou o estado de ânimo, permitindo que o tribunal decidisse sem se expor. As brigas anteriores expunham muito o tribunal. Além da parte administrativa, que a gente fala que é a parte subterrânea, que não se vê, está tudo organizado. A Central do Cidadão é algo importante e eficiente, atende qualquer demanda, as coisas andam rapidamente. Do ponto de vista interno do funcionamento do tribunal, demos passos importantes. Claro que alguns problemas ficam fora do nosso controle. Como presidente do Supremo, não tenho tanto poder assim. E defendi as prerrogativas do Supremo naquele confronto com a Presidência da República na questão do orçamento. A Presidência descumpriu a Constituição, como também descumpriu decisões do Supremo. Mandei ofícios à presidente Dilma Rousseff citando precedentes, dizendo que o Executivo não poderia mexer na proposta orçamentária do Judiciário, que é um poder independente, quem poderia divergir era o Congresso. Ela simplesmente ignorou. Aí fomos obrigados a tomar atitudes públicas de defesa, o que gerou aquela confusão toda no ano retrasado.
ConJur — Há pouco o STF julgou um processo de 1953.Cezar Peluso — Sim, fui o relator. Esse processo sofreu uma série de vicissitudes fortuitas. Aconteceu praticamente tudo o que se pode imaginar. Primeiro por envolver uma transação absolutamente gigante, pois o estado de Mato Grosso doou um mundaréu de terras divididas entre várias empresas colonizadoras. Era uma extensão duas vezes maior que o estado do Sergipe. A área de terra é de 42 mil quilômetros quadrados. Distribuiu para duas dezenas de colonizadoras com a obrigação de que ocupassem o território e o desenvolvessem. As colonizadoras fracionaram esses terrenos imensos, venderam lotes, foram criadas cidades, estradas, hospitais, abrindo lavouras, enfim, estimulando o desenvolvimento da região dentro do programa Marcha para o Oeste do governo Getúlio Vargas. Essa era uma parte do programa, mas o estado do Mato Grosso se esqueceu de que a Constituição de 1946 exigia que, para realizar essas doações ou concessões de domínio, o estado deveria pedir autorização para o Senado. Eles não pediram essa autorização e em 1953, quando se iniciou a demanda, já fazia anos que aquilo estava em andamento e execução. A União resolveu entrar com uma ação para anular essas concessões e se criou um problema de grandes dimensões, pois naquela altura não eram mais apenas aquelas duas dezenas de colonizadoras. Elas haviam vendido as terras para milhares de pessoas.
ConJur — Sobretudo a colonos vindos dos estados do Sul do país.Cezar Peluso — Sim, era agora uma questão de propriedades particulares, as empresas vendiam os lotes em cotas, trouxeram gente do sul, o agricultor comprava o lote, às vezes não se adaptava ou não dispunha de conhecimentos técnicos para realizar exploração e acabava vendendo para terceiros. E aí temos uma sucessão de proprietários e todas essas pessoas tinham de ser citadas no processo, afinal era a propriedade deles que estava em jogo. Imagine citar esse mundo de gente envolvida, e isso foi passando pela mão de vários ministros. Quando estava mais ou menos pronto para esse processo ser julgado anos atrás, se percebeu que faltava citar outros proprietários originais, que não se sabia onde estavam. Aí retomaram as diligências para corrigir a falha. Houve uma época em que a União percebeu que esse era um processo irreversível, na verdade tratava-se da dinâmica de urbanização, colonização e ocupação do território brasileiro, uma situação irreversível. Não seria possível voltar atrás na construção de vilas, cidades. A União desistiu do processo, isso não foi homologado e, portanto, o processo continuou. Quando assumi, tomei as últimas providências para que esta Ação Civil Originária 79 fosse julgada, pois era o processo mais antigo em andamento no Supremo. Fizemos o julgamento na semana passada. Quero ir embora, mas quero resolver essas histórias.
ConJur — Como é ver o sistema do Judiciário e da Justiça desde o centro do país? O que mudou em sua percepção? Cezar Peluso — Sou muito ligado à Justiça estadual, que é a Justiça mais próxima do povo, do cidadão, sem dúvida. Preocupo-me com ela e suas reivindicações. Mas também sou um crítico da Justiça estadual, conheço sua realidade, sei os pontos que deveriam ser mudados. Mas daqui de Brasília, a percepção muda ao ver que as coisas são mais graves do que se percebia quando estava em São Paulo. Há um problema na Justiça de São Paulo, gravíssimo, que é a falta de recursos. Agora, tirando isso, a Justiça de São Paulo é modelar. Mas no âmbito nacional, há problemas graves, sobretudo nas regiões mais longínquas. Uma das coisas que me convenceram a aderir à proposta do Conselho Nacional da Justiça no período de sua implantação foi haver convivido mais de perto com esses sérios problemas da Justiça no Brasil como um todo.
ConJur — Qual foi o momento de mais felicidade como ministro do STF?Cezar Peluso — Fora o momento da posse, nada de excepcional. Acho que nós julgamos assuntos muito importantes, alguns julgados rapidamente atendendo as demandas da sociedade, o Supremo respondeu bem a essa demandas, sobre a união homoafetiva, a diversidade de opinião, a lei de imprensa, tivemos 15 ou 20 decisões de grande repercussão social. O que me deixou de consciência tranquila é que, de certo modo, o tribunal se apaziguou um pouco durante minha gestão. Sabemos dos diálogos exacerbados entre os ministros, que aconteceram no passado. Durante minha gestão isso não aconteceu em nenhum momento. Tentei conduzir as reuniões do Plenário de uma maneira tranquila, de alto nível. Não houve nenhum episódio que relembrasse os atritos anteriores. Acho que minha moderação na direção do Supremo ajudou a refrear um pouco o entusiasmo ou o estado de ânimo, permitindo que o tribunal decidisse sem se expor. As brigas anteriores expunham muito o tribunal. Além da parte administrativa, que a gente fala que é a parte subterrânea, que não se vê, está tudo organizado. A Central do Cidadão é algo importante e eficiente, atende qualquer demanda, as coisas andam rapidamente. Do ponto de vista interno do funcionamento do tribunal, demos passos importantes. Claro que alguns problemas ficam fora do nosso controle. Como presidente do Supremo, não tenho tanto poder assim. E defendi as prerrogativas do Supremo naquele confronto com a Presidência da República na questão do orçamento. A Presidência descumpriu a Constituição, como também descumpriu decisões do Supremo. Mandei ofícios à presidente Dilma Rousseff citando precedentes, dizendo que o Executivo não poderia mexer na proposta orçamentária do Judiciário, que é um poder independente, quem poderia divergir era o Congresso. Ela simplesmente ignorou. Aí fomos obrigados a tomar atitudes públicas de defesa, o que gerou aquela confusão toda no ano retrasado.
Entrevistas
18abril2012
CEZAR PELUSO, O JUIZ
Para presidente do STF, Planalto é imperial e autoritário
“O Poder Executivo no Brasil não é republicano. É imperial”. Essa foi a conclusão a que chegou o presidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, diante do descumprimento da Constituição e das decisões do STF, pelo Palácio do Planalto, em matéria orçamentária, no ano passado. “Temos um Executivo muito autoritário”, conclui, ao lamentar a falta de independência do Congresso. O desabafo foi feito pelo ministro a este site, que hoje publica a parte final de sua entrevista.
Cezar Peluso, que se despede da Presidência do STF esta semana, revela aqui que o grande padrinho para sua nomeação como ministro, apesar do esforço do então ministro da Justiça, Márcio Thomas Bastos, foi o cardeal Dom Paulo Evaristo Arns.
A respeito de uma grande curiosidade da comunidade jurídica — se o ministro Joaquim Barbosa assumirá ou não o comando do tribunal — Peluso não duvida: “O Joaquim assume sim (...) Ele não recusará a Presidência do tribunal em hipótese alguma”. Problemas na coluna ele não tem, informa o ministro, baseado em informação do especialista Paulo Niemeyer. Peluso só receia pela capacidade do colega de bem relacionar-se com os demais ministros e com os advogados, em virtude de sua insegurança.
Neste quarto capítulo de sua entrevista, que começou a ser publicada no domingo, o ministro fala de sua preocupação com a onda populista que varre o Judiciário brasileiro e prevê que o STF tende a posicionar-se cada vez mais alinhado com a opinião pública. Ele lamenta não ter conseguido implantar um sistema de “consultas prévias” entre os ministros, para tornar as sessões mais céleres e evitar bate-bocas desnecessários, mas gaba-se de ter apaziguado a casa e reduzido, em sua gestão, as brigas que expunham o tribunal.
Sobre a corrupção, assunto de 90% das manchetes da imprensa brasileira, Cezar Peluso não esconde sua opinião: “A corrupção é um produto desta sociedade”. Ainda esta semana o site passa a publicar depoimentos e artigos sobre a passagem de Peluso pelo STF.
Leia a surpreendente entrevista do presidente do STF:
ConJur — Qual seu legado nesses curtos dois anos de Presidência?Cezar Peluso — Melhorei a máquina administrativa do tribunal, que é algo que não aparece, não são obras com placa de inauguração. Tomamos uma série de medidas importantíssimas na área administrativa, sobretudo na questão dos processos de repercussão geral. Esse é um instituto novo, não estava regulamentado. Essas medidas administrativas foram no sentido da ligação do Supremo com os demais tribunais. Pois essa, digamos, "ferramenta" da Súmula Vinculante tem um aspecto bastante complexo e é nesse contexto que precisamos da regulamentação, da criação de procedimentos. Fomos aos poucos regulamentando, criando mecanismos administrativos para dar feição a essas ideias. Terminamos uma rodada de reuniões nesta sexta-feira (23/3) com os presidentes e vice-presidentes e servidores dos tribunais do Brasil inteiro para afinar a sintonia com o Supremo. Existem temas repetitivos dos tribunais estaduais e locais que podem sobrestar, e que estão esperando uma uniformização por parte do STF, e isso pode criar dúvidas. Esse assunto é complexo. Iremos dar total transparência para a situação desses processos no site do STF. O cidadão poderá acessar esses processos e verificar onde estão e há quanto tempo estão, que decisões foram tomadas, o que está acontecendo. Qual o seu número e quando estão pautados para entrar em julgamento. É uma radiografia total da situação, dentro do Supremo, em relação a cada ministro e ao plenário. Além de ser transparente, para advogados em particular, mas para qualquer cidadão, esse é um instrumento de gerenciamento que irá permitir, por exemplo, saber que um processo que trata de matéria específica deu entrada cinco anos atrás e é necessário dar prioridade a ele. Antes não havia isso. Ninguém sabia. Ninguém tinha acesso aos processos em andamento do STF, nem se fez levantamento tão minucioso. O futuro presidente do STF receberá agora esse legado, terá esse material e levantamento histórico na mão e poderá estabelecer prioridades. Esse instrumento de gestão é importantíssimo.
ConJur — Trata-se de criar um banco de dados no Supremo?Cezar Peluso — Exato, e isso é algo que antes não havia. Hoje, praticamente não se trabalha mais com papel, tornamos praticamente definitivo o processo eletrônico. Todos os processos originados no Supremo, ações de inconstitucionalidade, habeas corpus, tudo hoje é eletrônico. Não se aceita mais nada em papel, exatamente para implantar o sistema eletrônico. Temos até cálculos, nessas informações, da economia de tempo, gerando eficácia.
ConJur — Há pouco o STF julgou um processo de 1953.Cezar Peluso — Sim, fui o relator. Esse processo sofreu uma série de vicissitudes fortuitas. Aconteceu praticamente tudo o que se pode imaginar. Primeiro por envolver uma transação absolutamente gigante, pois o estado de Mato Grosso doou um mundaréu de terras divididas entre várias empresas colonizadoras. Era uma extensão duas vezes maior que o estado do Sergipe. A área de terra é de 42 mil quilômetros quadrados. Distribuiu para duas dezenas de colonizadoras com a obrigação de que ocupassem o território e o desenvolvessem. As colonizadoras fracionaram esses terrenos imensos, venderam lotes, foram criadas cidades, estradas, hospitais, abrindo lavouras, enfim, estimulando o desenvolvimento da região dentro do programa Marcha para o Oeste do governo Getúlio Vargas. Essa era uma parte do programa, mas o estado do Mato Grosso se esqueceu de que a Constituição de 1946 exigia que, para realizar essas doações ou concessões de domínio, o estado deveria pedir autorização para o Senado. Eles não pediram essa autorização e em 1953, quando se iniciou a demanda, já fazia anos que aquilo estava em andamento e execução. A União resolveu entrar com uma ação para anular essas concessões e se criou um problema de grandes dimensões, pois naquela altura não eram mais apenas aquelas duas dezenas de colonizadoras. Elas haviam vendido as terras para milhares de pessoas.
ConJur — Sobretudo a colonos vindos dos estados do Sul do país.Cezar Peluso — Sim, era agora uma questão de propriedades particulares, as empresas vendiam os lotes em cotas, trouxeram gente do sul, o agricultor comprava o lote, às vezes não se adaptava ou não dispunha de conhecimentos técnicos para realizar exploração e acabava vendendo para terceiros. E aí temos uma sucessão de proprietários e todas essas pessoas tinham de ser citadas no processo, afinal era a propriedade deles que estava em jogo. Imagine citar esse mundo de gente envolvida, e isso foi passando pela mão de vários ministros. Quando estava mais ou menos pronto para esse processo ser julgado anos atrás, se percebeu que faltava citar outros proprietários originais, que não se sabia onde estavam. Aí retomaram as diligências para corrigir a falha. Houve uma época em que a União percebeu que esse era um processo irreversível, na verdade tratava-se da dinâmica de urbanização, colonização e ocupação do território brasileiro, uma situação irreversível. Não seria possível voltar atrás na construção de vilas, cidades. A União desistiu do processo, isso não foi homologado e, portanto, o processo continuou. Quando assumi, tomei as últimas providências para que esta Ação Civil Originária 79 fosse julgada, pois era o processo mais antigo em andamento no Supremo. Fizemos o julgamento na semana passada. Quero ir embora, mas quero resolver essas histórias.
ConJur — Mas os ministros Lewandowski, Marco Aurélio e Ayres Brito não entenderam assim a questão, afinal, parece que não foram exatamente os pobres de Mato Grosso os principais beneficiários. Marco Aurélio disse que se estava jogando a Constituição no lixo.Cesar Peluso — O problema é que o tribunal entendeu — e a meu ver com toda a razão, e propus isso — que desfazer hoje essa concessão, que tem mais de 60 anos, um erro do começo dos anos 1950, implicaria teoricamente destruir cidades, aeroportos, seria uma situação indescritível. Isso seria um despropósito sobre uma situação que está consolidada e que é irreversível. A terra voltaria para o estado de Mato Grosso? Hoje o estado está dividido. Acho que foi uma solução sensata do tribunal.
ConJur — Como é ser ministro em Brasília?Cezar Peluso — Ser ministro é muito honroso, sem dúvida. Mas é muito penoso, em termos de serviço. A gente não tem hora. Antes eu achava que trabalhava muito, de sábado, domingo. Mas aqui em Brasília o volume de trabalho não é possível explicar, só vivendo. Há 30 funcionários no meu gabinete, como se fosse uma pequena empresa. São seis assessores, analistas de diversos graus que organizam, recolhem materiais, para que eu possa estudar os processos. Quando cheguei ao STF, peguei 12 mil processos à minha espera. As sessões são às terças, quartas e quintas. Elas começam às 2h da tarde e não têm hora para terminar.
ConJur — Como foi a convivência com personagens tão díspares como os ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa ou Nelson Jobim?Cezar Peluso — São ministros oriundos de áreas de diversas e isso é importante, eles têm ricas contribuições, com pontos de vista diferenciados. Veja o caso do ex-ministro Nelson Jobim: ter vivência da área política foi seu grande diferencial. O que alguns acham que era uma falha do Jobim na verdade era sua grande qualidade. Como ele veio da área política, havia a impressão de que lhe faltava compromisso com o Judiciário. Pelo contrário, é um homem dotado de grande espírito público. Sua atuação na Presidência do STF me surpreendeu, ele quis marcar sua administração por um avanço significativo da função do Judiciário. E justamente por não ter vícios de origem e espírito de corporação exerceu a visão global, foi aberto para compreender as preocupações das diferentes áreas. Isso foi importante e fez a diferença. Ele presidiu o tribunal numa época crucial de mudanças no Judiciário, e isso não poderia ter sido conduzido de modo melhor, pois o Jobim tinha exatamente a visão política do todo, de não ficar preso a miudezas do dia a dia do Judiciário. Ele foi capaz de chegar ao macro e perceber os pontos de estrangulamento do Judiciário. Não é que apenas a questão de que o juiz trabalhe pouco, ou porque tem pouco juiz em um determinado estado, o problema tem outros vieses. E ele fez levantamento de tudo isso.
ConJur — Como, por exemplo, o excesso de recursos e demandas que o próprio governo cria?Cezar Peluso — Não é só o governo. O Jobim fez um levantamento no Rio de Janeiro identificando um grupo de empresas que se serve do Judiciário para ganhar tempo em determinadas causas que sabem que terão de pagar; mas com a demora, aplicam o dinheiro e acabam lucrando. Um escândalo. Usam o Judiciário para tirar proveito, sabem que demorar a pagar é mais rentável. E isso paralisa o Judiciário.
ConJur — Como é ver o sistema do Judiciário e da Justiça desde o centro do país? O que mudou em sua percepção? Cezar Peluso — Sou muito ligado à Justiça estadual, que é a Justiça mais próxima do povo, do cidadão, sem dúvida. Preocupo-me com ela e suas reivindicações. Mas também sou um crítico da Justiça estadual, conheço sua realidade, sei os pontos que deveriam ser mudados. Mas daqui de Brasília, a percepção muda ao ver que as coisas são mais graves do que se percebia quando estava em São Paulo. Há um problema na Justiça de São Paulo, gravíssimo, que é a falta de recursos. Agora, tirando isso, a Justiça de São Paulo é modelar. Mas no âmbito nacional, há problemas graves, sobretudo nas regiões mais longínquas. Uma das coisas que me convenceram a aderir à proposta do Conselho Nacional da Justiça no período de sua implantação foi haver convivido mais de perto com esses sérios problemas da Justiça no Brasil como um todo.
ConJur — E havia a discrepância gritante em termos de salário.ConJur — São Paulo é o estado que pior paga a seus juízes. E há outra distorção: o número de entrâncias, de degraus, é enorme. Na Justiça Federal são duas ou três. Então, há uma diferença maior de vencimentos entre os diferentes níveis. Tive alunos, na época em que lecionava na PUC-SP, que passaram nos dois concursos, para juiz estadual e federal, e disseram: “professor, não tem jeito, gosto muito da Justiça estadual, mas não dá”. E essa situação não depende do Judiciário, mas do Executivo estadual, que precisa ter maior sensibilidade para isso. No longo prazo, o Executivo degrada a qualidade dos quadros funcionais da magistratura do estado.
ConJur — Alguns pesquisadores dizem que não é o CNJ que resolverá o problema do Judiciário, mas sim uma injeção maciça de dinheiro para informatizar, adequar, melhorar as instalações.Cezar Peluso — Eu mesmo fiz críticas como essa. Essa censura que me fazem, dizendo que mudei de ponto de vista, é injusta. Sempre fui claro. Examinando a crise do Judiciário, achava que a criação do Conselho era um instrumento válido, mas não o principal para resolvê-la. Os problemas macro do Judiciário são dois: o primeiro é a demora excessiva. Embora haja demora no mundo inteiro, aqui ela não é razoável. O segundo é a grande massa da população sem acesso ao Judiciário. Os marginalizados, os excluídos da cidadania, não sabem de seus direitos. E mesmo que soubessem, não têm instrumentos para viabilizar o acesso ao Judiciário. Pois o sujeito que mora na roça, ou na periferia, não tem acesso a um advogado, que mora ou atua no centro da cidade. A organização estatal de assistência judiciária é precária. Alguns estados ainda não se moveram para efetivar as defensorias públicas. A Justiça funciona basicamente para a classe média e para um grupo de empresas. Porque até as grandes empresas já não vão ao Judiciário, só em alguns casos. Preferem arbitragens em escritório de advocacia. Essa é a grande questão da Justiça, ser uma Justiça para todos. Mas, repito, não se pode falar em reforma séria do Judiciário sem tocar no orçamento. São Paulo, que do ponto de vista econômico é o estado mais forte, só agora está começa a informatizar seu tribunal. Não por negligência da direção do tribunal, mas por absoluta falta de dinheiro.
ConJur — Qual foi o momento de mais felicidade como ministro do STF?Cezar Peluso — Fora o momento da posse, nada de excepcional. Acho que nós julgamos assuntos muito importantes, alguns julgados rapidamente atendendo as demandas da sociedade, o Supremo respondeu bem a essa demandas, sobre a união homoafetiva, a diversidade de opinião, a lei de imprensa, tivemos 15 ou 20 decisões de grande repercussão social. O que me deixou de consciência tranquila é que, de certo modo, o tribunal se apaziguou um pouco durante minha gestão. Sabemos dos diálogos exacerbados entre os ministros, que aconteceram no passado. Durante minha gestão isso não aconteceu em nenhum momento. Tentei conduzir as reuniões do Plenário de uma maneira tranquila, de alto nível. Não houve nenhum episódio que relembrasse os atritos anteriores. Acho que minha moderação na direção do Supremo ajudou a refrear um pouco o entusiasmo ou o estado de ânimo, permitindo que o tribunal decidisse sem se expor. As brigas anteriores expunham muito o tribunal. Além da parte administrativa, que a gente fala que é a parte subterrânea, que não se vê, está tudo organizado. A Central do Cidadão é algo importante e eficiente, atende qualquer demanda, as coisas andam rapidamente. Do ponto de vista interno do funcionamento do tribunal, demos passos importantes. Claro que alguns problemas ficam fora do nosso controle. Como presidente do Supremo, não tenho tanto poder assim. E defendi as prerrogativas do Supremo naquele confronto com a Presidência da República na questão do orçamento. A Presidência descumpriu a Constituição, como também descumpriu decisões do Supremo. Mandei ofícios à presidente Dilma Rousseff citando precedentes, dizendo que o Executivo não poderia mexer na proposta orçamentária do Judiciário, que é um poder independente, quem poderia divergir era o Congresso. Ela simplesmente ignorou. Aí fomos obrigados a tomar atitudes públicas de defesa, o que gerou aquela confusão toda no ano retrasado.
ConJur — Com as oscilações de saúde, o ministro Joaquim Barbosa assume após o ministro Ayres Brito?
Cezar Peluso — O Joaquim assume, sim. Viram como ele está comparecendo ao Plenário? Teve uma melhora grande, antes quase não aparecia. Agora, comparece a todas as sessões. Ele não recusará essa Presidência em circunstância alguma, pode ficar tranquilo. Tem um temperamento difícil, não sei como irá conviver, primeiro com os colegas. Não sei como irá reagir com os advogados, pois tem um histórico desde o episódio com o Maurício Correia [ministro aposentado do Supremo. Em 2006, Joaquim Barbosa, no Plenário, sugeriu que o então presidente do STF fazia tráfico de influência]. Também não sei como irá se relacionar com a magistratura como um todo. Isso já é especular. Ele é uma pessoa insegura, se defende pela insegurança. Dá a impressão que de tudo aquilo que é absolutamente normal em relação a outras pessoas, para ele, parece ser uma tentativa de agressão. E aí ele reage violentamente.
Conjur — O clamor social é o clamor da mídia. A sociedade quer linchamento. A sociedade não é contra a corrupção, ela é contra a corrupção do outro.Cezar Peluso — A corrupção é um produto desta sociedade. O que me chamou a atenção e me fez entender uma série de coisas, foi quando li uma pesquisa realizada há uns três ou quatro anos, uma consulta feita entre jovens de 16 a 21 anos. Uma das perguntas era: você, para subir na vida, ser bem sucedido economicamente, seria capaz de fazer qualquer coisa do ponto de vista ético? E esses jovens responderam que sim. Uma sociedade com uma juventude que não vê limites éticos nem morais para ser bem sucedida economicamente só pode resultar em uma sociedade de corruptos. Os corruptos não nascem por geração espontânea ou de ETs e discos voadores.
ConJur — Ministro, como o senhor vê isso, no seu caso: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter nomeado uma pessoa do lado oposto de seu arco ideológico?Cezar Peluso — Isso que irei dizer é uma interpretação puramente subjetiva de minha parte. No começo, o Marcio Thomaz Bastos [advogado e ex-ministro da Justiça] estava bancando o meu nome com certa força, pois ele me conhecia de longa data. Mas houve um momento em que até ele achou que a minha candidatura tinha ido por água abaixo. Acho, e que isso fique claro, que o Dom Paulo Evaristo Arns escreveu uma carta que foi decisiva. Houve a carta. Foi um apoio importante, pois ele me conhecia, havíamos participado de vários encontros, no grupo de juízes na época do regime autoritário. Como já contei, nos reuníamos periodicamente com várias pessoas, leigas e padres também, para discutirmos a realidade brasileira. Várias vezes levei o Dom Paulo para casa depois dessas reuniões, e íamos discutindo assuntos daquele momento. Mas concorria comigo para a vaga do STF um juiz ligado à Associação dos Juízes pela Democracia [o juiz, hoje desembargador Dyrceu Aguiar Dias Cintra Jr.], que tinha apoio de toda a esquerda, até do MST, ele era ligado ao PT. O Lula ficou sensibilizado com isso. O que eles fizeram? Um amigo ou amiga desse juiz conseguiu uma carta de apoio do cardeal endereçada ao Lula.
Subscribe to:
Posts (Atom)