4.3.12

A respeito da demora do Executivo Federal nas nomeações para o Judiciário

4março2012
SEGUNDA LEITURA

Tribunais aguardam Executivo nomear magistrados

O Poder Judiciário vem atraindo cada vez mais a atenção da mídia. Ao que parece, atacá-lo passou a ser esporte nacional, o segundo em preferência, perdendo apenas para o futebol. Intimidado, cala-se, absorvendo críticas justas e injustas. Suas boas iniciativas não interessam e nem repercutem além dos limites de uma comarca ou no interior de um Tribunal.
Ocorre que, apesar de suas mazelas ─ que devem ser apontadas e combatidas ─ o Poder Judiciário vem se adaptando à nova realidade. O site de um Tribunal hoje é totalmente diverso do existente 10 anos atrás. O acesso à jurisprudência foi facilitado, há programas sociais e de gestão ambiental, projetos de conciliação, de entrega de armas, cursos para servidores, boas iniciativas enfim.
Mas, o que pouco se fala, é que muitos problemas que se atribuem ao Poder Judiciário não são de sua responsabilidade. Um exemplo: a intimação pessoal do MP, Procuradorias de órgãos estatais e Defensoria Pública importa em significativo atraso no andamento dos processos. Os autos vão à sede do órgão e voltam, em intrincada burocracia que se agrava conforme o tamanho da cidade. Exigem-se veículos, servidores, guias de remessa e de entrega, enfim, uma série de medidas.
Entre as causas inominadas de problemas na administração da Justiça, uma há que passa despercebida, mas que muito colabora para que as dificuldades aumentem. Refiro-me à nomeação de ministros dos Tribunais Superiores e desembargadores dos Tribunais de segunda instância do Poder Judiciário da União (TRFs, TRTs e TREs). Explico.
Na Justiça dos Estados as promoções dos juízes e desembargadores são feitas pelo presidente do TJ, após votação pelo Plenário ou Órgão Especial. Facílimas. Normalmente, na mesma sessão. O presidente, via de regra, nomeia o mais votado. O governador só nomeia os indicados pelo TJ no caso do quinto constitucional (OAB e MP).
Na Justiça da União é diferente. As promoções para desembargador e a nomeação de ministro dos Tribunais Superiores, é ato privativo do presidente da República, conforme CF, artigos 84, inc. XVI, 94, inc. I, 104, par. único, 111, 107, 111-A, 115, 119, inc. II, 120, inc. III e 123, par. único.
O processo é simples. Elaborada a lista, o presidente do Tribunal envia os nomes ao ministro da Justiça. Os indicados saem à busca de contatos políticos. É preciso ter apoios importantes (v.g., do governador do Estado) e de duas ou três pessoas próximas de quem decide. Mas, no vale-tudo eleitoral, entra até ofício de Diretório Acadêmico. Descobrir uma professora primária ou a vizinha amiga da mãe de quem decide são armas também utilizadas.
No Ministério da Justiça providencia-se a juntada do currículo do candidato e a relação de seus apoios políticos, no que se conhece por “grade”. E o ofício segue para a Casa Civil da Presidência da República, onde o processo é ultimado e submetido à chefia do Executivo.
Fácil é ver que não é algo simples examinar listas tríplices de 57 Tribunais. É um contínuo chegar de ofícios contendo três nomes, dos quais só um será o escolhido. Conta-se que Getúlio Vargas, ao fazer tais escolhas, dizia; “pronto, agora tenho um ingrato e dois inimigos”.
Comenta-se que atualmente dezenas de listas aguardam nomeação na Presidência da República. Procurei inutilmente estes procedimentos administrativos no site do Ministério da Justiça, da Casa Civil e da Presidência da República.
Nada tendo encontrado, pus-me a pensar que se cobra tanto a transparência no Poder Judiciário, mas que... Ou será que os procedimentos estão em algum site e eu que não achei, por não ter solicitado o assessoramento de minha neta.
No insucesso da busca nos sites mencionados, a única saída é a pesquisa individualizada. Nada fácil. Como saber a situação de 57 Tribunais, exceto consultando um a um?
Aleatoriamente, verifiquei que aos 22/8/2011 o TRF-4 indicou Jorge Antonio Maurique para o cargo de desembargador federal. Foi nomeado somente aos 25/1/2012, tomando posse em 24/2/2012. O advogado Agrimar Rodrigues de Araújo foi indicado por volta de 25/3/2011, em lista tríplice do TRE do Piauí, tendo sido nomeado em 7/12/2011.
No STJ, em sessão de 29/9/2011, foram escolhidos em lista tríplice para provimento do cargo de ministro da Corte os desembargadores federais Néfi Cordeiro (TRF-4), Assusete Magalhães (TRF-1) e Suzana Camargo (TRF-3). Estamos em março e ainda se aguarda a indicação da Presidência da República ao Senado, para a sabatina e posterior nomeação.
Além de muitas as listas, de pedidos políticos de toda ordem, da dificuldade da Chefia do Executivo saber quem merece mais para o TRT do Amapá ou para o TRE do Rio Grande do Sul, ainda surgem complexas situações jurídicas, como a aplicação do artigo 93, inciso II, alínea "a" da CF/88, que obriga a nomeação de quem for indicado três vezes consecutivas ou cinco alternadas, aos Tribunais da União, o que já gerou dois mandados de segurança no STF (TRF-2 e TRT-15).
A demora acarreta uma série de problemas à administração da Justiça. Convoca-se um substituto, que exerce o cargo transitoriamente, nunca sabendo se no dia seguinte ali estará. A jurisprudência se altera, retirando a segurança jurídica. Abre-se um claro na instância inferior, resultando em atraso no andamento dos processos. Os indicados passam meses a atender telefonemas, fazer visitas e cuidar da nomeação, com flagrante prejuízo aos serviços a seu cargo.
Não seria mais razoável que as nomeações, pelo menos dos juízes de carreira promovidos a desembargador nos TRFs e TRTs, passasem à Presidência de seus Tribunais? A agilização seria flagrante, seriam promovidos no dia da indicação.
A Presidência da República ver-se-ia livre deste fardo e teria mais tempo para as múltiplas e complexas atividades a seu cargo (v.g., Comissão da Verdade x militares), para situações emergenciais (recursos de 530 bilhões de euros do Banco Central Europeu ao bloco) ou políticas (exploração nuclear do Irã).
Nos casos de oriundos da classe dos advogados ou do MP e para os Tribunais Superiores, não seria razoável fixar-se o prazo para a indicação? Sessenta dias?
Aí está um problema a afetar o Judiciário para o qual ele não concorre. Quem se anima a enfrentar o problema, a auxiliar na solução?
Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF 4ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR.
Revista Consultor Jurídico, 4 de março de 2012

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